ODE A SOLIDÃO?

É claro que muito se pode construir e gozar sozinho. Todavia, muitas coisas podem também se perder, sobretudo quando lembro que sou o que sou a partir do convívio com todos e tudo que me influenciaram a estar onde estou e saber onde posso ir e quero não voltar onde estava.
Saliento a necessidade de está atento às diferenças entre ser e estar. Nos nada somos na realidade, pois apenas estamos tanto biologicamente, socialmente e psicologicamente  a única estrutura que não segue a esta dinâmica é a nossa dimensão espiritual. Talvez por isso que poucos sabem desta estrutura.
E como negamos as nossas realidades psicológicas, penso que apenas fugimos do nada que somos e assim impedimos evoluir como cidadão, mas também subjetivamente e pior espiritualmente.
Pretensiosamente continuamos mentindo a nós mesmo. Cultuamos o corpo, o trabalho, o dinheiro, tudo para negarmos que nada somos e ainda inviabilizamos perceber que estamos em processo, nunca chegaremos ao nível da perfeição.
Mas porque gostamos de viver imersos em mentiras. Esquecemos que um idoso pode e deve curtir sua infância atualizada a sua atual realidade, mas não muitos preferem viver usando meios de se infantilizar, escolhendo a dependência característica da infância para obter atenção e proteção.
Muitas pessoas querem ser belas usando mudanças (des)caracterezantes de seu fenótipo e biótipo. Esquecem que na realidade, o belo está na simplicidade da nossa diversidade.
Outras vivem buscando a quem responsabilizar por seus erros e medos. Impedindo aproveitar um amadurecimento e descobertas.
Muitos amam se apaixonar para amar. Tantos equívocos acham que da amizade não nasce amor.
Parece-me que grande parte de nossos contemporâneos, igualmente a tantas outras civilizações são assoladas por um mal que hoje chamamos mal do século, Freud chamava em sua época de melancolia.
Para falar dela incio o que Nina Saroldi, 2011, traz sobre o que construímos desde tenra idade a partir das relações fundantes de nossa subjetividade. Aquela base que monta nosso modo futuro de pensar em ser ou sentir. É o que Freud chama de O ideal de do eu. “ (...) é preciso concebe-lo em duas partes, uma das quais ataca impiedosamente  a outra. A parte vitimada é aquela que passou por um processo de identificação e que contém o objeto perdido introjetado em si mesmo. A parte raivosa é a consciência, a instância crítica (...)(p.51)”.
De alguma forma, a parte que hostilizamos em nós mesmos, são as explicações para a parte que negamos em nós mesmos dentro daqueles exemplos afirmados por mim em querermos mudar nossos fenótipos e biótipos; quando culpamos os outros por nossos desencontros; ou apenas assumir as partes das fases da vida que nos colocam dependentes (...) enfim, de alguma nos punimos em usos de substâncias psicoativas e vivermos metidos fugindo de nós mesmos.
Todo esse processo é a constituição mais fria para abraçarmos nossos demônios silenciosos, tão barulhentos que a loucura das dores fundamentadas no nada. É a depressão, antes chamada “A melancolia (...) é propícia à visualização do processo porque nela ele ocorre de modo extremo (...) É difícil verificar o que absorve tanto o melancólico, porque ele insiste em autorrecriminar, em se apresentar como um ser desprovido de valor” (p.51).
Ela é o desnudamento do inevitável que tentamos esconder atrás de máscaras e (auto)mentiras, aquelas a melhoras apenas encontradas no outro quando bom. Pois, geralmente é visto apenas em coisas, inclusive, a pessoas são usadas como objetos, na realidade tudo expressa, ao fundo “Seu delírio de inferioridade, sobretudo moral (...) O melancólico  (...) tem uma grande dificuldade de se separar de seu objeto; é justamente o caminho da aceitação da perda que lhe parece interditado. (p.51)
De tantas mentiras a si mesmo leva “A perda de algum objeto na realidade material é sentida como a perda de si mesmo (...) as coisas se passam como se o sujeito tivesse deixado a si mesmo. (...) na melancolia para entendermos a relação entre o eu e o seu ideal é a redução da autoestima que nela aparece. Para o enlutado - é sempre em comparação ao luto que Freud descreve a melancolia, por pior que seja a perda, há clareza em relação ao fato que o outro se foi, não ele. No caso da melancolia essa clareza não existe, porque o sujeito transformou uma parte de seu eu em objeto e “determinou” a trata-lo mal pelo fato de ter sido deixado”. (p.52)
Freud hipotetiza que esse desamparo nasce da relação primeira com nossos significantes e outro teórico ainda não trouxe melhor explicação para responder a demanda da dor e do vazio de ser deixado, esquecido, não ser amado como concebemos o como ideal para cada um de nós, “É da pressuposição necessária do amor igualitária do pai que a família retira sua forma como formação de grupo”.(p.55).
Ela segue sinalizando a partir do psicanalista “O ideal do eu tem como tarefa verificar a efetiva realidade das coisas (p.54) Quando crianças nos sentimos maravilhados e, ao mesmo tempo, temerosos diante desses seres superiores que são nossos pais. Posteriormente, colocamos esses seres em nós mesmos na forma de ideal de eu, o representante de nossas relações com eles (...) ao erigir o ideal do eu, o eu domina e ultrapassa o complexo de Édipo, mas ao mesmo tempo se coloca em posição de submissão ao isso. (...) O ideal do eu se liga às mais alta aspirações humanas. Toda as religiões, por exemplo, dependem dessa instância – deriva do anseio pelo pai – para existir. A humildade dos crentes da mais variadas procedências teria tido sua origem no autojulgamento que declara ser possível ao eu atingir seu ideal”. (p.59-60)
E por nunca conseguiremos alcançar essas altas aspirações, sobretudo porque esses eles  (nossos pais) são tão falíveis que nós. E também, porque eles também erraram sonhar como as mesmas aspirações, para entendermos como é complexa nossa fragilidade é saber por exemplo de quem é o procriador do Ideal do eu é o grande Outro. E este último pode ser exemplificado, pode ser indicado que o Outro é o capitalismo.
Tanto que Freud observa que professores e pessoas em posição de autoridade continuam na sociedade (...) a tarefa iniciada pelo pai iniciada no seio da família: a de manter vivos os conteúdos do ideal do eu e exercer as funções de consciência e censura moral. Para Freud existiria ainda uma espécie de transmissão filogenética do isso. ( p.60)
Enfim,  o contexto nosso de cada dia é vivermos intensamente descobrindo como somos dependentes sim um dos outros, sejamos humildes. E verdadeiros com a nosso dom de sermos medrosos e errantes, pois nada somos apenas estamos em processo. E assumir isso dar-nos a possibilidade de termos mais bases para encarar o real mal do século a falta de (alto)amor.

Se não nos percebamos assim continuamos morrendo, apenas, nunca vivendo, no máximo (sobre)vivendo.

Comentários

Postagens mais visitadas